E ali estava ela, imóvel, como estivera nas últimas semanas,
com o seu olhar apagado e o rosto carregado de tristeza. Nada à sua volta a
fazia mover, parece que o mundo parara para ela.
Todos julgavam que recuperaria, que tinha sido apenas um
choque e que o tempo curaria tudo, mas não era isso que demonstrava. Cada dia
caía mais sobre si, não falava, apenas chorava e as poucas vezes que soletrava
algumas palavras eram tristes e fracas.
Para si caíra o tempo suficiente e já era tempo de voltar a
subir os degraus em que tropeçara. Contudo, olhava em volta e não via como.
Tudo à sua volta era escuro e sombrio e quando se tentava apenas levantar havia
algo que a fazia de novo cair.
A verdade é que nunca esperara chegar onde chegou, sempre
tinha mostrado ser uma rapariga leve e sem qualquer problema, no entanto, todos
aqueles tropeções estavam a torná-la cada vez mais fraca. Já não se reconhecia;
tinha emagrecido, as suas olheiras já se tinham tornado permanentes e o brilho
dos seus olhos tinha-se desvanecido. A vida pregara-lhe algumas partidas e
outras foram pregadas por si própria.
O tempo parecia ter sido interminável, tudo passava tão
devagar como aquele rio que ela via correr da janela do seu quarto. Mas havia
chegado o momento em que a sua cabeça gritou de desespero e o seu corpo quis
finalmente mexer-se daquele estado imóvel em que se mantivera nos últimos
tempos. Era tempo de reagir, afinal de contas era uma jovem e tudo o que
passara não fora mais do que provas, provas essas que quase a fizeram desistir
de tudo, mas às quais sobrevivera.
Pôs-se por fim de pé, com toda a força e determinação que todos
conheciam dela. Ao olhar-se ao espelho sorriu para si. Houvera muito tempo que
não o fizera com medo de si própria, mas chegara o dia e naquele momento nada
conseguia desfazer aquele sorriso de orgulho no que via. No fundo, sobrevivera
à escravidão do seu interior e daí em diante apenas desejava celebrar a vida e
tudo o que nela existe. Afinal de contas, só se vive uma vez e tudo o que hoje
existe amanhã fará parte unicamente da memória.


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